quinta-feira, 1 de junho de 2017

Análise do peoma 'A tela contemplada' de Carlos Drummond de Andrade


 A tela contemplada

Pintor da soledade nos vestíbulos 
de mármore e losango, onde as colunas 
se deploram silentes, sem que as pombas 
venham trazer um pouco do seu ruflo; 

traça das finas torres consumidas 
no vazio mais branco e na insolvência 
de arquiteturas não arquitetadas, 
porque a plástica é vã, se não comove, 

ó criador de mitos que sufocam, 
desperdiçando a terra, e já recuam 
para a noite, e no charco se constelam, 

por teus condutos flui um sangue vago, 
e nas tuas pupilas, sob o tédio, 
é a vida um suspiro sem paixão.



Ele que pinta a tela de pessoas nuas é o pintor de quadros. Os vestíbulos são tristes. Pessoas sem as suas coisas são tristes. Os vestíbulos são vistos como não arquitetados, mas na verdade, o eu-lírico fala das coincidências e acasos da vida. Volta para a edificação falando que a plástica é vã, falando também do pintor do início. Isso já dá o tom de que as artes são vãs quando não causam reação. O eu-lírico se mostra, aqui, que está entediado com a vida, que a vê como vazia e triste.

Criador de mitos que sufocam é o pintor. O eu-lírico volta a falar sobre as coincidências da vida, arquiteturas não arquitetadas. Das pessoas estarem em um momento íntimo com desconhecidos. Diz então que elas voltam para a noite: o momento antes de dormir, os sonhos. Nós ficamos pensando nas coisas que acontecem e na vida. E tudo isso, toda a existência vai para o charco, vira lixo. Falando com o pintor novamente, fala que ele é vazio e entediado com a vida. O eu-lírico diz que a vida é um ‘suspiro sem paixão’.  Ou seja, um suspiro sem vontade de viver, apenas entediado com a existência.

O poema fala sobre o tédio com a vida e que nem a arte nos comove. O eu-lírico se mostra triste e decepcionado com a existência mundana. Ele não sente que algo pode nos salvar, nem a arte. Mostra que mesmo as coincidências da vida viram lixo. Mostra que tudo que vemos é tedioso e triste. Nem a poesia é o bastante.


- João Vitor Latini